quinta-feira, 15 de abril de 2021

"Trova do Vento que Passa" - Ano de gravação

Em todo o lado menciona que foi em 1963 o ano de gravação deste tema, juntamente com "Pensamento", "Capa Negra, Rosa Negra" e "Trova do Amor Lusíada".

Vamos à verdade dos factos:

"Manuel Alegre foi preso em Luanda a 17 de abril de 1963, um ano depois de ter sido mobilizado para a guerra em Angola. Chegou como oficial miliciano, e rapidamente se envolveu numa conspiração de golpe contra o regime que não se concretizou" (1)

"Permanece preso durante seis meses, na prisão de S. Paulo de Luanda. Terminada a mobilização militar, em finais de 1963 , foi colocado com residência fixa em Coimbra" (2)

"(...) onde é “«objeto duma perseguição permanente, sistemática, de provocações dos tipos da PIDE.» É assim que todas as noites um amigo acompanha-o a casa, muitas vezes o amigo é Adriano Correia de Oliveira. Numa dessas noites, em plena Praça da República, Manuel Alegre exprime a sua revolta:

«Mesmo na noite mais triste / Em tempos de servidão / Há sempre alguém que resiste / Há sempre alguém que diz não». E o Adriano diz: «mesmo que não fiquem mais versos, esses versos vão durar para sempre». Ficaram. «E depois o poema surgiu naturalmente».

Tinha nascido a "Trova do vento que passa".

«Tentou encaixar-se aquelas trovas no fado tradicional mas não dava. E, de repente, o António Portugal saiu-se com aquela música.

Três dias depois vieram para Lisboa, para uma festa de recepção aos caloiros na Faculdade de Medicina sem pedir a respectiva autorização à PIDE. Manuel Alegre foi apresentado por Silva Graça, fez um discurso emocionado, depois o Adriano cantou e quando acabou de cantar «(...) foi um delírio, teve que repetir três ou quatro vezes, depois cantou o Zeca, depois cantaram os dois. Saímos todos para a rua a cantar. A Trova do vento que passa passou a ser um hino para aquela malta» ”(3)

Disse Manuel Alegre sobre o Zeca neste evento:

"Reencontrámo-nos em princípio de 1964 (Zeca estava em Faro a lecionar) numa festa de recepção aos caloiros da Faculdade de Medicina, no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, tinha eu acabado de regressar da cadeia em Angola. Trazíamos de Coimbra «A Trova do Vento que Passa». (4)

A Festa de Recepção aos Caloiros de Medicina ocorreu em 21 de janeiro de 1964, na Cantina do Hospital de Sta Maria, Lisboa.

Rocha Pato jornalista de Coimbra tendo colaborado em diversos jornais é pai do Rui Melo Pato. Como todos o sabem e se não sabem ficam a saber, Rui Pato, que apelidei de o último 'dinossauro' ainda vivo desse tempo mágico, começou a tocar com o Zeca em 1962 tinha Rui Pato, 16 anos.

Rocha Pato, como pai, fez uma coisa que passe o tempo que passar, fez e faz história, ia recortando notícias dos jornais onde o seu filho Rui atuava, tanto com o Zeca como com o Adriano. E fez isso aquando a apresentação da «Trova do Vento que Passa». Recortou e escreveu a data, 20 de janeiro de 1964. Talvez a data de saída da notícia no Jornal pois o evento, conforme refere a notícia, deve ter ocorrido no dia seguinte à tarde, ou seja dia 21.

Por isso o EP onde está «A Trova do Vento que Passa» nunca podia ter sido gravado em 1963.

(1) - https://expresso.pt/sociedade/2017-04-19-O-postigo-um-quadrado-de-onde-se-via-o-ceu-o-azul-o-azul-do-la-fora-todo-o-azul-o-azul-da-vida-1
(2) - http://cvc.instituto-camoes.pt/contomes/16/escreveu.html
(3) - (Manuel Alegre in Raposo, Eduardo M., Cantores de Abril, Lisboa, Ed. Colibri, 2014, p. 194).
(4) - A Outra Memória de Manuel Alegre

quarta-feira, 14 de abril de 2021

Biografia

Adriano Correia de Oliveira

Adriano Maria Correia Gomes de Oliveira era filho de Joaquim Gomes de Oliveira e de sua mulher, Laura Correia. Adriano mudou-se para Avintes ainda com poucos meses de vida. Criado numa família profundamente católica, a infância de Adriano Correia de Oliveira é marcada pelo ambiente que descreverá mais tarde como «marcadamente rural, entre videiras, cães domésticos e belas alamedas arborizadas com vista para o rio [Douro]». Depois de concluir os estudos secundários, no Liceu Alexandre Herculano, no Porto, Adriano Correia de Oliveira matriculou-se na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, em 1959.

Durante os anos passados em Coimbra, tem uma intensíssima participação no meio cultural e desportivo ligado à academia. Viveu na Real República Ras-Teparta, foi solista no Orfeon Académico, membro do Grupo Universitário de Danças e Cantares, ator no CITAC, guitarrista no Conjunto Ligeiro da Tuna Académica e jogador de voleibol na Briosa (já em Lisboa iria representar o S.L. e Benfica).

Na década de 1960 adere ao Partido Comunista Português, envolvendo-se nas greves académicas de 62, contra o salazarismo. Nesse ano foi candidato à Associação Académica de Coimbra, numa lista apoiada pelo MUD.

O seu primeiro EP é de 1961, 'Noite de Coimbra', com António Portugal e Eduardo de Melo à guitarra portuguesa, e Durval Moreirinhas e Jorge Moutinho à viola.

Em 1964 grava o EP 'Trova do Vento que Passa' acompanhado por António Portugal e Rui Pato. A 'Trova do vento que passa', poema de Manuel Alegre, iria tornar-se uma espécie de hino da resistência dos estudantes à ditadura.

Em Outubro de 1966 casa-se em Lisboa fixando aí residência, com Maria Matilde de Lemos de Figueiredo Leite, filha do médico António Manuel Vieira de Figueiredo Leite (Coimbra, Taveiro, 11 de Outubro de 1917 - Coimbra, 22 de Março de 2000) e de sua mulher Maria Margarida de Seixas Nogueira de Lemos (Salsete, São Tomé, 13 de Junho de 1923), depois casada com Carlos Acosta. O casal, que mais tarde se separaria, veio a ter dois filhos: Isabel, nascida em 1967 e José Manuel, nascido em 1971.

Chamado a cumprir o Serviço Militar entre 1967 e 1970, Adriano Correia de Oliveira tentou retomar o curso de Direito, embora sem resultados práticos. Já licenciado da tropa, vai exercer funções no Gabinete de Imprensa da FIL - Feira Industrial de Lisboa, até 1974.

Ainda em 1969 vê editado o álbum 'O Canto e as Armas', revelando, de novo, vários poemas de Manuel Alegre. Pela sua obra recebe, no mesmo ano, o Prémio Pozal Domingues. Lança 'Cantaremos', em 1970, e 'Gente d'aqui e de agora', em 1971, este último com o primeiro arranjo, como maestro, de José Calvário, e composição de José Niza. Em 1973 funda a Editora Edicta, com Carlos Vargas, para se tornar produtor na Orfeu, em 1974.

Com a Revolução dos Cravos, Adriano Correia de Oliveira está entre os fundadores da Cooperativa Cantarabril. Em 1975 lança 'Que nunca mais', onde se inclui o tema 'Tejo que levas as águas'. A revista inglesa Music Week elege-o Artista do Ano. Em 1980 lançaria o seu último álbum, 'Cantigas Portuguesas', ingressando no ano seguinte na Cooperativa Era Nova, em ruptura com a Cantabril.

Vítima de uma hemorragia esofágica, morre em 16 de outubro de 1982, na quinta da família, em Avintes, nos braços da sua mãe.

A 24 de Setembro de 1983 foi feito Comendador da Ordem da Liberdade e a 24 de Abril de 1994 foi feito Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique, ambas as condecorações a título póstumo.

segunda-feira, 22 de março de 2021

Festa do Avante - 1981

Programa da Festa, onde anuncia a presença de Adriano no dia 6 pelas 16:45 no Palco da Juventude (à mesma hora iria participar Zeca Afonso no palco 1 que, devido a problemas de garganta, não atuou).

sábado, 13 de fevereiro de 2021

Livre e Artista

Lousã Henriques

Para a altura em que ele cantou certas coisas, foi um homem valente. Cantou coisas em que se afirmava, num tempo em que a repressão era muito violenta (...) encarou isso sempre com grande coragem, com grande postura. Não era um homem de inocências políticas. Era um homem que sabia perfeitamente o que queria e por que lutava. Nasceu para ser livre e para ser artista”.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021

Coragem e generosidade

«(...) Importa, mais, é acentuar que na prática concreta, ele nunca se vendeu a nada, nem sequer a um certo consumismo cultural, como sempre privilegiou as actuações ao vivo em agremiações populares e recreativas, associações, clubes, etc., (...) sempre com a PIDE à ilharga, em que o Adriano se dava com a coragem e a generosidade que eram as suas características essenciais. Tudo com a sua naturalidade simples e o seu riso largo.»

J. Carlos de Vasconcelos

foto: 'Festa do Avante', 1980, Alto da Ajuda, com Elsa Bruxelas (ID Carlos Salomé)

domingo, 7 de fevereiro de 2021

De Manuel Teixeira (cantor e músico)

Dizem que era truculento, falador, ingénuo, tolerante, corajoso, solidário.
Dizem que tinha coração de oiro, voz de alaúde e rosto de maçã. Que fazia de qualquer canção ser outra canção.
Dizem que fazia amigos em qualquer parte do mundo, que era atento aos outros e bom comedor de petiscos.
Morreu novo, muito novo. Ficou a sua voz a perguntar notícias ao vento que passa.
Os amigos dizem que foi para o céu e que espera por eles à mesa.

quarta-feira, 20 de janeiro de 2021

Boémio Cantor

Louzã Henriques

“Era uma boa pessoa, muito ligada aos seus amigos, vivendo sempre num clima de uma certa boémia artística que apreendeu em Coimbra, mas que se prolongou em Lisboa”.

Manuel Pires da Rocha

Naquele ano a Festa (do Avante) foi em Julho. Estivemos uns dias a ensaiar em casa do Manuel Louzã Henriques, seu amigo e camarada desde os tempos de juventude em Coimbra. Com o Adriano Correia de Oliveira nunca se ensaiava. Não era preciso, porque as cantigas sabíamo-las de cor dos comícios, da rádio, dos discos de vinil e capa grande, de outras vozes que lhas foram roubando e entregando nos lugares onde faziam falta. Mas daquela vez ensaiou-se. Porque havia uma cantiga nova, com música que o Adriano tinha composto para um poema de Eugénia Cunhal – «o tempo passa amor / correm os dias…», que ficou por gravar – e o cantor exigiu-se recatos que a vida de andarilho permanente não lhe permitiam (recatos de que nem gostava).

À hora marcada, não me recordo se de sexta-feira se de sábado, subimos ao palco no Alto da Ajuda, o Adriano, eu e o Paulo Vaz de Carvalho, para a última vez em que cantou na Festa do jornal do seu Partido.

daqui:

https://www.avante.pt/pt/2263/argumentos/144864/Adriano-Correia-de-Oliveira-est%C3%A1-connosco.htm?fbclid=IwAR0HSuRrHpYv93QRJRxSG_sGiSiR6AocHAVCkEPVLQkPHS9vDUtgLjRv474